segunda-feira, 30 de agosto de 2010

E tu, onde tens a tua pátria?

Por causa da multiculturalidade do meu novo trabalho, e porque quando acabar o projecto vou ter quase tantos anos "cá fora como lá dentro", sou obrigada quase diariamente a discutir o conceito de pátria.
Nao sou catalã, por supuesto, mas muitas das sua ideias e manias foram-se incorporando na minha pessoa. Como dizia Fernando Pessoa da Coca-Cola, "primeiro estranha-se e depois entranha-se", o mesmo se passou comigo, e hoje sou levada a defender algumas coisas que os meus colegas, acabados de chegar e deparados com o catalão, as diferenças culturais com Madrid, o pan-amb-tomaquet, etc, não conseguem entender e, dando o passo natural seguinte, chateiam-se. Consigo perceber a sua perspectiva, eu já fui assim aos 19 anos, acabadinha de chegar e com uma tweeny a 1200km, mas cresci, vi o que tinha a ganhar se me mantivesse open-minded - fui incorporando as novidades que me agradavam e fui tentando entender aquilo com que discordava. Hoje tenho a minha própria opinião formada, não é boa nem má, mas é pouco susceptivel às novas perspectivas de alguns dos meus colegas que, sabendo-me estrangeira, acham que partilho. Não é que seja senhora da verdade, sou é demasiado velha para estas novas andanças, até porque posso afirmar que escolhi estar aqui neste momento da minha vida (bem ou mal, o tempo o dirá). E seria um pouco ingrato rebeliar-me contra a terra que me deu a oportunidade de fazer tudo que me deu na real gana nestes ultimos 7 anos (curso, bolsa de trabalho...) e onde tenho amigos que me levaram ao colo em muitas alturas. Não sei. Não sou catalã, mas também já não sou estrangeira neste pais, o que me faz não pertencer a nenhuma equipa - sinto-me um pouco "lost in translation". Não digo isto para me queixar, digo isto to prove a point.
Sou portuguesa claro. Sou portuguesa porque partilho com os portugueses algo tao importante como a educação, o património cultural, a lingua, o fado, os ditados populares, o humor negro, os desenhos animados da RTP1, os livros da Alice Vieira, etc... e isto, parecendo que não, é um laço que não quebra. Tenho em Portugal o meu cantinho, "una playa y un pueblo que me acompañan de noche cuando no estás junto a mi...". Mas, por muito portuguesa que seja, já Portugal também me sobra um pouco, porque vi outras coisas, experimentei, incorporei... e mudei. Já só Portugal não me chega.
E voltamos à pergunta inicial: onde está a tua pátria?
Acho importante saber de onde vêem as pessoas. E não para separá-las por blocos, mas para entender. Tenho a experiencia de que, durante os primeiros dias em todos os departamentos, eu sou "a portuguesa", mas que isso não quer dizer nada, não faz mal. Porque sei que, uns dias mais tarde, quer seja pelo meu trabalho, o meu humor negro ou outra coisa qulaquer, eu vou passar a ser conhecida pelo meu nome próprio. Definitivamente. E isso conquista-se e tem um saborzinho a chocolate belga. E por isso nao me envergonho ou orgulho-me exageradamente de onde venho, porque "sou mais que isso".
Mas que é importante saber de onde partes, isso é - porque quer queiras quer não a cultura traças as linhas das fundações sobre as quais nos vamos erguer. E porque para mim é mais fácil entender diferenças culturais que perdoar defeitos de educação. Explico: aceito naturalmente que temos distintas perspectivas porque temos distintos backrounds (os power rangers não chegaram a todas as partes), mas resulta-me fisicamente impossível aceitar a malformação de base. Por isso, falando com um colego meu que opinava que nao nos podiamos definir pelo nosso pais de origem, eu respondia que tudo isso era verdade, mas que não nos podíamos esquecer do nosso ponto de partida, porque isso explicava muito acerca de quem éramos. E ainda bem que assim é. Se eu nao pudesse culpar a alma portuguesa pelo meu saudosismo e pouco habilidade prática, estava bem lixada.
E voltando à pátria... deixo-te diferentes perspectivas:
Numa noticia da Vanguardia, que também não posso aportar (grrr... espera só até eu ter assinatura e ter acesso à ediçao completa online!) um investor de Sillicone Valley dizia que eram os imigrantes quem mais facilmente aportavam investimento ao seu país de acolhida porque, nao estando viciados pela cultura e educaçao, conseguiam perceber mais facilmente de que é que o país necessitava. Esta era a forma como ele entendia o conceito de pátria, alguém que fazia algo pelo país, mesmo que nao fosse originariamente o seu.
Por outro lado um professor de Oxford (essa noticia tenho guardada para te mostrar hehehe) teoriza que somos responsáveis por tudo o que os nossos antepassados fizeram, pelo que deveriamos ir tentando corregir com a nossa vida os erros da história, and make emends for all that can be traced to our godfathers. Essa é a sua pátria.
E qual é a nossa? Ou, melhor, qual é a minha?
No meio destas andanças, não sei. Acho que a minha pátria não é nada físico, ou até é: a aldeia com 20 casas e um sino cada quarto de hora (ainda que não saiba quanto tempo mais me resta por lá), o fado da Mariza e do Camané, a lareira, o oceano Atlântico, a Grande Noite, o pai e mãe sem falhar à espera no aeroporto, a sopa de agriões com feijão da avó, a Vanguardia, as stroopwafels, o Skype, a paella de marisco, a Estació de Sants, os waffles da Australian com a tia e os miúdos, a RFM, os bagels de sementes do supermercado da tua rua, o teu sotão em Delft, a ópera de Amsterdam em alemão, sei lá...
Podes pensar que estou a delirar totalmente, mas lembrei-me de tudo isto porque pensava na facilidade que era explicar a confusao da minha cabeça neste pequeno blog. Acho que, acima de tudo, tenho de concordar com Fernando Pessoa: a minha pátria é a lingua portuguesa. E por isso as minhas amigas dizem que pareço outra pessoa quando falo português. E por isso odeio o acordo ortográfico.
A minha pátria é a lingua portuguesa. E és tu, por supuesto :)

PS: vaya rollo t'he fotut!

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